sobre sentimentos tristes, vontades perigosas e decepções dolorosas.
Descrição do post.
7/26/20247 min read


1. dormir, morrer e viver.
eu não vivo por mim. não vivo para ver meu futuro, para conhecer meus filhos nem para, possivelmente, um dia me sentir feliz. eu sobrevivo, então, para que minha irmã não precise estar sempre sozinha, para que minha mãe não chore durante a madrugada e para que meus cachorros possam descansar do meu lado. eu vivo sobrevivendo e eu sobrevivo sem viver. é estranho. não faz sentido, mas, infelizmente, é assim. dessa forma, eu durmo de noite e acordo de manhã. desligo o despertador e como um ovo mexido. levanto, ainda cheia de preguiça, escovo os dentes e aliso o cabelo. vou andando até a varanda, sento em frente ao espelho e, enquanto seguro o choro, escondo minhas olheiras com uma maquiagem qualquer. quando dá a hora, entro no carro e vou para faculdade. passo o dia lá (quando consigo) e depois volto para casa. volto para casa para voltar a dormir. dormir é bom. dormir me faz bem. dormir é fechar os olhos e, de certa forma, morrer por alguns segundos. por alguns minutos. por algumas horas. dormir, para mim, é morrer o suficiente para conseguir viver mais um dia. para conseguir viver mais um dia e garantir que os que eu amo não sintam a mesma necessidade de partir que eu. eu não vivo por mim. eu vivo por elas, por eles e por vocês.
2. o dia em que eu achei que era anjo.
um texto sobre coisas que não tenho coragem de fazer (mas já quis)
nas primeiras horas de algum dia do mês de maio, eu, por um momento, quis voar. o céu estava escuro, meu hálito cheirava a vodka e meu casaco se encontrava no chão. dos meus olhos escorriam lágrimas, da minha boca saíam gritos e do meu coração pingava sangue. fui até a varanda, tentei me acalmar e, de repente, me deparei com um buraco na rede. foi um momento mágico. fantástico. quase que indescritível. observei-o calmamente: meu corpo parecia caber perfeitamente naquele círculo desprotegido. era insano: quanto mais eu olhava para aquela abertura, mais uma voz me chamava. me chamava em direção ao paraíso. prometia tirar minha dores, curar minhas feridas e me apresentar a felicidade. diante disso, minhas asas foram crescendo, se abrindo, se preparando, então, para voar. tentei subir no sofá para que a decolagem fosse mais bonita. fechei os olhos. respirei. um. dois. três… um, dois, três e nada. nada. simplesmente nada. ao invés de me deparar com a eternidade, dei de cara com você. com você segurando minha cintura e falando que não era hora de eu partir. não era hora de eu pular, voar e virar uma lembrança. não era a hora de eu ir. ainda.
3. chorar, rezar e implorar.
um texto sobre alguém, mas não sobre mim
como era ser sua? bom, de vez em quando, era uma merda. uma grande merda. uma merda porque eu só queria ser amada. e uma merda porque você sabia que não precisava me amar. não precisava me amar porque eu não ia embora - eu não conseguia - e você sabia disso. sabia que eu não era capaz de te deixar. não era capaz de te odiar. então eu chorava e você me fodia. me fodia psicologicamente e espiritualmente. eu sofria. eu rezava. eu implorava por carinho. por risadas. por consideração. afinal, eu só queria uma confirmação de que você me queria na sua vida. eu só queria ter certeza de que você não ia me deixar. eu só queria entender o quê tanto você pensava. mas você não me falava e eu não era capaz de adivinhar. então, de novo, eu chorava, rezava e implorava. implorava para morrer ao seu lado. chorava para ganhar um abraço e rezava para não ser desprezada. chorava, rezava e implorava para você me dar valor. para você ver que podíamos ser felizes. mas aí, como sempre, você seguia me fodendo. e o ciclo continuava. eu seguia machucada e você seguia vivendo sua vida sem perceber que eu estava completamente quebrada.
(in)felizmente, em determinado momento, eu explodi. eu sei que você lembra. sei que você lembra do dia em que arrumei minha mala, abri a porta e corri em direção à liberdade. sei que você lembra do seu corpo vindo atrás do meu. do seu pedido de desculpas e do primeiro “não” que você ouviu sair da minha boca. sei que você lembra das minhas lágrimas, dos seus gritos e da placa do táxi, no qual eu entrei. acredita em mim, eu sei que você lembra da última vez em que você me viu. eu lembro também. lembro de cada momento. de cada sensação e de cada emoção. lembro da dor, da alegria e da adrenalina. lembro de achar que sem você eu não era ninguém. mas eu era. ou melhor, eu sou. eu sou alguém. e, por mais que eu odeie admitir isso: eu sou alguém que sente falta de você. contudo, eu continuo chorando, rezando e implorando. chorando por você ainda ter parte do meu coração. rezando para que você esqueça que eu existo. e implorando para nunca mais te ter de volta.
4. tô chateada.
a verdade é que algumas decepções são maiores do que outras. algumas decepções apertam mais o coração. algumas derramam mais lágrimas e murcham mais sorrisos. algumas decepções são pessoas. e algumas pessoas são decepções.
5. escrever.
eu gosto de escrever. não me considero boa, mas gosto de escrever. a verdade é que escrevo para me libertar. para me libertar da dor, da angústia e do amor. para me libertar deles e daqueles. me libertar de mim e de você. acontece que têm vezes em que as palavras não saem e, enfim, me resta sofrer. me resta sofrer pelo o que aconteceu, pelo o que está acontecendo e, ainda, pelo que vai acontecer. não é fácil. não consigo e muito menos sei lidar. lidar com as coisas ruins e, também, com as coisas boas. com as decepções e com as surpresas. com o fato de que nem tentando consigo superar. superar o que já passou. o que me destruiu e me machucou. eu gosto de escrever. escrever me faz sã. mesmo sabendo que o resultado é temporário. mesmo sabendo que vai durar apenas alguns minutos. vale a pena. vale a pena o sofrimento que segue minhas palavras dolorosas e cheias de mágoa. o alívio é grande demais para eu apenas ignorar. escrever é como um vício. um vício que eu não pretendo largar.
6. medicina.
queria que a medicina fizesse sentido. mas ela não faz. quando sofria com um incômodo nas costas, fui encaminhada ao ortopedista. já meus problemas renais, ficaram sob cuidados de um nefrologista. até aí dá pra entender: tem médico para tudo. tem médico que cuida da cabeça, outros que estudam os dentes e têm alguns, ainda, que se especializam em fazer cirurgias. e dentro dessa bagunça toda, entre milhares de termos e denominações, tem, também, o cardiologista. cardio vem de coração. nesse viés, a meu entender, cardiologista é o médico que conhece o coração. que examina o coração. que sara o coração. mas é aqui que entra a confusão. se cardiologista é médico de coração, por que nenhum deles consegue arrumar uma solução para a minha dor? eles falam que não é assim. que eles cuidam de doenças, síndromes e remédios. que meu coração sangrando não é objeto da medicina. mas é. ele é (eu acho). ele precisa ser. eu preciso que o aperto no meu peito esquerdo passe antes que ele me faça morrer.
7. o alfabeto.
o alfabeto, na língua portuguesa, possui vinte e seis letras. vinte e seis letras indo de “a” até “z”. e vinte e seis letras voltando de “z” até “a”. vinte e seis é maior que quatro. que doze. e que dezenove. entretanto, o mesmo vinte e seis não chega a superar o grandioso número trinta. nem o sincero cinquenta e sete. e, muito menos, o inconfundível noventa e nove. diante do exposto, ouso afirmar, então, que dentro da realidade dos ‘cem’, ‘mil e duzentos’ e ‘um bilhão e mais um pouco’: vinte e seis é um número pequeno. vinte e seis é um número pequeno derivado de duas vezes treze. um número pequeno que não consigo contar em meus dedos. um número pequeno que, no mundo das letras, é capaz de formar cerca de quinhentas mil palavras. pois é. de vinte e seis letras a meio milhão de palavras. é apavorante e é incrível. é incrível como algo tão pequeno e tão irrelevante, é capaz de se desdobrar e se transformar em uma imensidão de possibilidades.
tendo isso em vista, resolvi inovar. resolvi não pensar, apenas dizer e me comparar. resolvi, assim, que, no mundo da língua portuguesa, minha dor é como as palavras. pois é. confuso. eu sei. nesse viés, para confundir mais ainda, entendo, também, que as letras representam meus gatilhos. mas como assim?
como já vimos, temos, no alfabeto, um número finito de letras. são vinte e seis. vinte e seis letras. vinte e seis letras humildes, mas poderosas. nessa sequência, meus gatilhos, assim como essas ditas letras, são limitados. são específicos. serei sincera. não devem ser vinte e seis. não sei quantos são. contudo, assim como as letras, esses gatilhos se unem e se juntam. os gatilhos se combinam. se combinam para poder formar uma dor. “uma” dor, não “a” dor. isso porque, de forma semelhante a como as letras se agrupam, a fim de dar origem a palavras distintas, meus gatilhos se misturam para dar lugar a alguma dor. alguma dor que nunca será igual a anterior. alguma dor que dói. que dói muito. alguma dor que dói, independente da maneira como veio a se formar.